No episódio relativo ao tal decreto do Presidente da Bolívia, penso que é preciso que todas as nossas intervenções sejam centradas nos seguintes aspectos:
1) Os contratos e os investimentos na Bolívia os quais colocaram o Brasil refém do gás boliviano foram realizados por FHC;
2) O contrato de compra do gás boliviano assinado por FHC foi altamente prejudicial ao Brasil, pois obrigou a Petrobrás a comprar todo o gás produzido - 30 milhões de m3 por dia - e pagar por todo ele, enquanto só utilizávamos cerca de 8 milhões de m3 e queimávamos (literalmente) o restante;
3) A "Petrobrás Bolívia" - subsidiária da Petrobrás - extrai o gás e o vende, na Bolívia, à Petrolífera estatal da Bolívia. A Petrolífera estatal da Bolívia vende o gás à Petrobrás, no Brasil.
4) O contrato de fornecimento de gás é estabelecido entre a Petrolífera estatal da Bolívia e a Petrobrás, nada tendo a ver com a Petrobrás Bolívia e obriga a Bolívia a vender ao Brasil 30 milhões de m3 diários e a Petrobrás a comprar esse volume, sendo o preço fixado no próprio contrato que vigora até 2019.
5) Só é possível qualquer modificação no contrato por acordo mútuo entre as partes (Petrobrás e a Petrolífera estatal da Bolívia) ou decidido em arbitragem internacional independente das partes por solicitação de uma delas.
6) Os termos do tal decreto de Evo Morales não rompem qualquer contrato. O decreto estabelece regras dentro do direito inerente à soberania da Bolívia. O que estabelece o decreto:
a) Um aumento de imposto a ser pago na operação de venda do gás para a Petrolífera estatal boliviana (quem vende são as empresas que extraem o gás, entre elas a "Petrobrás Bolívia" (há uma da Espanha/Argentina e uma da França). Isso é direito (ainda que se possa não concordar) do governo boliviano;
b) A nacionalização das reservas de petróleo e de gás existentes no território boliviano, tal como ocorre no Brasil;
c) A nacionalização das refinarias de petróleo existentes na Bolívia, entre elas as duas (as maiores) da Petrobrás Bolívia.
d) Um prazo de 180 dias para os entendimentos entre as empresas que possuem refinarias e o governo boliviano sobre o processo e as condições em que se dará a nacionalização, incluindo o valor das indenizações pertinentes. Isso é, também, direito da Bolívia e não constitui quebra de contrato, pois não se configura confisco nem expropriação.
7) O que vale são os termos formais do decreto e não a retórica populista e oportunista que eventualmente seja praticada por autoridades bolivianas.
8) Não há hipótese de interrupção do fornecimento do gás boliviano ao Brasil, pelas seguintes razões:
a) O presidente da Bolívia tem declarado em todos os seus pronunciamentos que não haverá a interrupção;
b) A interrupção do fornecimento levaria o caos imediato à Bolívia, porque:
i) Teria que ser interrompida a extração do gás. Como junto com o gás vem um condensado do qual se extrai (por refino) a gasolina e o óleo diesel que atendem à demanda da Bolívia, haveria a falta desses insumos no País (na Bolívia), paralisando toda a sua estrutura;
ii) A venda do gás ao Brasil rende à Bolívia US$ 800 milhões/ano, o que corresponde a 1/3 de toda a arrecadação do País. Sem essa receita, a Bolívia não teria como sobreviver;
iii) A Bolívia não tem outra opção de venda do gás senão à Petrobrás no Brasil, pois o escoamento só pode se dar através do gasoduto que está em território brasileiro e é propriedade da Petrobrás. Qualquer outra solução não se viabilizaria em menos de 2 anos;
iv) A interrupção do fornecimento, aí sim, configuraria a quebra de um contrato em vigor até 2019 e extrapolaria o direito da Bolívia gerando, então, uma crise de conseqüências que seriam muito danosas ao Brasil (traria dificuldades - não intransponíveis) mas com danos irreparáveis para a Bolívia.
9) A Bolívia não pode aumentar o preço do gás unilateralmente. O Presidente da Petrobrás já declarou pública e peremptoriamente que a Petrobrás não aceitaria tal aumento se fosse proposto pela Bolívia.
10) Para aumentar o preço, então, a Bolívia teria que recorrer à arbitragem independente internacional (o foro, definido no contrato, é Nova York, nos EUA).
11) A tentativa de lideranças do PSDB e do PFL e de alguns integrantes da Mídia de estabelecer o pensamento de que existe uma "crise de grandes proporções" e de levar o governo federal a "endurecer o discurso" a fazer "ameaças" e a tomar providências radicais "preventivas" se dá por conta das eleições. Eles sabem que isso deixaria Lula numa situação de fragilidade.
Eles mesmos, depois, diriam que Lula não foi estadista, que teria agido como um guerrilheiro, como sindicalista e que teria fechado as portas para as negociações, etc... É preciso desmascarar a oposição e dizer essas coisas a toda hora.
Roberto Lopes de Abreu
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Departamento de Estruturas Matemáticas
quarta-feira, maio 10, 2006
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